Caríssimos irmãos, já estamos no segundo domingo da Quaresma, domingo do diálogo amoroso de Deus com o seu povo;
domingo da revelação do projeto libertador de nosso Deus altíssimo.
Desde o segundo domingo do Tempo Comum, são Lucas vem de forma insistente
evidenciando a palavra de Jesus como o ápice de nossa vida e nosso caminhar.
Novamente direi que no segundo domingo do TC, nas Bodas de Cana, Maria
coloca a palavra de Jesus em evidência quando pede aos serviçais que façam tudo
o que Ele mandar; no domingo seguinte o próprio Jesus declara que toda palavra
anunciada pelos profetas realiza-se e dá pleno cumprimento Nele; já no quarto
domingo Jesus é expulso de sua cidade natal justamente por causa de sua
Palavra, no quinto domingo do tempo comum, Pedro declara que “em atenção a Palavra de Jesus, ele lançará
[novamente] as suas redes[1]”.
Domingo passado, vimos que Jesus sai vitorioso do deserto por causa da sua
fidelidade à palavra de Deus.
E hoje é o próprio Deus quem coloca as palavras de Jesus como centro na
vida de todo aquele que quer cumprir fielmente o projeto divino do Pai.
Para que cumpramos com fidelidade o nosso compromisso de cristão selado
em nosso batismo e confirmado conscientemente na crisma, devemos, assim, como
são Paulo, ser imitadores de Cristo e seguir como exemplo aqueles que viveram
ou que procuraram viver de maneira mais assídua os ensinamentos do Evangelho.
A Transfiguração do Senhor nos traz inúmeros ensinamentos que se fossemos
destrinchá-los ficaríamos horas e horas dialogando sobre eles. Por isso, hoje,
gostaria de refletir três importantes lições que a Sagrada Liturgia nos
proporciona neste dia; lições essas que vão ao encontro dos propósitos
quaresmais e que devem estar presentes na vida de cada cristão que é: a oração, a escuta amorosa da palavra (e, o
reconhecimento da história de nossa salvação) e a disponibilidade à missão
cristã.
Assim como na vida de Jesus, a oração
é quem nos coloca em sintonia com o Senhor, ajudando-nos a compreender e
cumprir o projeto divino do Pai em nossa vida.
Em todos os momentos decisivos na vida de Cristo, os evangelistas fazem
questão de mostrá-los em plena comunhão com o Pai através da oração,
confirmando as palavras de Jesus que dizem: “Eu
e o Pai somos um[2]”.
Esta intimidade do Pai e do Filho Lucas salienta afirmando que Jesus
subiu a montanha para rezar e enquanto Ele rezava, Deus revela aos seus a
glória de seu Filho amado.
Sem a oração em nossa vida esse dialogo amoroso entre Deus e o homem se
rompe fazendo com que ele deixe de compreender a boa nova tornando-se, assim,
um inimigo da cruz de Cristo.
A falta de oração nos deixa como aqueles apóstolos que ficaram
anestesiados e completamente paralisados na busca de tornar o reino do céu
presente no nosso dia-a-dia, no hoje, no aqui e no agora.
Todas as desgraças que vivemos atualmente e, também em toda a história do
mundo, é devido a essa falta de intimidade com Deus; nossas famílias já não se
preocupam com a sua vida espiritual , dedicando-se apenas às riquezas materiais
e desnecessárias; hoje, o que interessa é satisfazer de modo exorbitante os nossos
prazeres corporais e, sobretudo, o nosso ego e bem estar.
Lembro-me que antigamente quando íamos para a catequese já sabíamos ao
menos algumas orações que nos colocavam em sintonia com o Pai e também já
sabíamos algumas das principais histórias de nossa salvação, hoje, esse cenário
é completamente diferente, as crianças que vão à catequese já não sabem nem
mesmo qual é o sinal que nos identifica como cristãos.
Muito nos questionamos de o porquê nossas famílias são desestruturadas, o
porquê a pastoral A ou B não vai pra frente; o porquê minha família é cheia de
problemas, o porquê essa ou aquela pastoral não atinge as propostas
estabelecidas.
E a própria palavra de Deus é quem vai nos responder essas perguntas e ao
mesmo tempo nos questionar: primeiro - como está à vida de oração de cada
membro de nossa família ou de nossa pastoral; e segundo - como está à vida de
oração da minha família ou da minha pastoral enquanto comunidade; e algo de
extrema importância que não podemos deixar passar sem questionar: o que estou
fazendo para contribuir com a vida contemplativa de cada membro de nossa
família e de nossa pastoral.
São Paulo vai nos dizer que “embora
sendo muitos, formamos um só corpo em Cristo, e, cada um por sua vez, é membro [uns]
dos outros[3]”.
Portanto, cada um de nós temos responsabilidade com os nossos familiares, com
os membros de nossas pastorais e, sobretudo, com cada um dos irmãos de Cristo.
Queridos amigos, quando não temos intimidade com o Senhor, intimidade
esta que só ocorre através da oração, ficamos como Pedro, João e Tiago
completamente medrosos com qualquer situação adversa que nos possa ocorrer.
O papa Bento XVI nos lembra em sua catequese[4] semanal
que todo cristão deve conhecer a história de sua salvação para poder, assim,
fundamentar a sua fé; todo cristão deve escutar atentamente o que o Senhor quer
nos dizer. Se não for para isso que nos reunimos semanalmente, então nossas
celebrações estão sendo frívolas e inúteis.
Pedro e os outros certamente ficaram com medo, primeiro porque não haviam
criado uma verdadeira harmonia com o Senhor, vejamos que enquanto Jesus rezava,
seus discípulos dormiam; e depois porque eles não tinham intimidade com as Sagradas
Escrituras, ou seja, com a história de nossa salvação. Como então compreender
os designos de Deus se eu não mantenho nenhuma relação com aquele que me criou?
A nuvem na Sagrada Escritura é um sinal da presença de Deus em meio a seu
povo, como por exemplo, na fuga dos hebreus rumo à terra prometida, onde Deus
os protege por meio de uma nuvem[5];
ou quando Salomão declara que o Senhor escolheu habitar a nuvem escura[6] e
tantas outras menções que a Bíblia nos faz sobre a presença amorosa de Deus no
meio de seu povo.
O próprio Jesus diz que tudo o que foi escrito e anunciado pelos profetas
se realiza e dá pleno cumprimento Nele.
O encontro de Jesus com Moisés e Elias quer justamente nos mostrar esta
íntima relação entre o Antigo e o Novo Testamento. Como sabemos, Moisés
libertou os hebreus da escravidão do Egito e Elias que libertou o povo da
idolatria e da opressão de um rei perverso e autoritário, mostrando que é se
entregando ao Deus uno e verdadeiro que seu “fardo se torna suave e seu jugo leve[7]”.
Esses dois grandes nomes da Antiga Aliança afastam-se nos mostrando que
estamos em um novo momento da história, onde Deus já não falará por meio dos
profetas, mas Ele próprio é quem vai nos falar; mostrando-nos que a Nova e
Eterna Aliança nos libertará de uma vez por todas da escravidão do pecado e da
morte.
Assim como estamos fechados para a oração, estamos igualmente fechados
para a escuta amorosa da palavra; fechamos os nossos ouvidos para aquilo que o
Senhor quer nos falar.
Jesus a todo o momento grita em nossos corações: “levantem-se, e não tenham medo[8]”,
vocês foram batizados para anunciarem a boa nova, portanto, “ide pelo mundo inteiro e anunciem a todos o
Evangelho[9]”,
esta é a sua missão de cristão. Sai desta tenda, tome a sua cruz e segue o meu
exemplo.
Ao invés de irmos ao encontro do outro, vivemos estagnados como aqueles
apóstolos na montanha, querendo armar a nossa tenda onde tem somente a paz e a
tranquilidade, esquecendo que existem milhares de pessoas precisando da luz de
nosso Deus e Salvador.
A Campanha da Fraternidade deste ano nos mostrou que cinco em cada cem
mil jovens, entre 15 e 24 anos se suicidam aqui no Brasil; que várias pessoas
não têm referências de valores humanos e religiosos em sua vida, entregando-se
as drogas, a violência e, tantas outras situações que devem nos deixar
angustiados.
Mas Jesus vem ao nosso encontro para nos tranquilizar, para nos acalmar
de todo o medo e angustia, “Eis que
estarei convosco todos os dias até o fim do mundo[10]”
e “na minha Igreja o poder das trevas
chamais prevalecerá[11]”.
Que possamos meus amigos, a partir de nosso projeto pessoal, contribuir
para o bem comum de toda a humanidade, pois o “Senhor é a nossa luz e [nossa] salvação[12]”.
“Este é o meu Filho amado,
Escutai-o”.
Louvado seja o nosso Senhor Jesus Cristo!